domingo, 26 de dezembro de 2010

GULLAR GULLAR

Ferreira Gullar - Fonte: Internet
Nos próximos dias, entraremos em um novo ano,  este blog passará também por algumas reformulações estéticas. Mas por enquanto isso, vamos seguindo com a estrutura de 2010. O texto a seguir foi publicado em O Estado do Maranhão desta Semana e trata sobre o trabalho de dois grandes poetas. Boa leitura!




GULLAR NO OLHAR DE QUIROGA
José Neres


Marcus V. Quiroga - imagem: Site do Antônio Miranda
            Há diversas maneiras de homenagear um escritor do porte de Ferreira Gullar. Essa homenagem pode vir em forma de leitura de seus textos em prosa ou em verso; de estudo aprofundado de sua biobibliografia; de análise crítica de seus inúmeros textos; ou da absorção de seu estilo para a confecção de novos textos que, em alguns momentos, podem até (con)fundir-se com a poética do grande escritor maranhense.
            Professor com doutorado em Literatura, pesquisador experiente, poeta detentor de diversos prêmios literários, membro da Academia Carioca de Letras e do PEN Clube do Brasil, Marcus Vinicius Quiroga não esconde de ninguém que é um grande admirador da obra do autor do Poema Sujo e, como forma de imortalizar essa admiração, mergulhou durante anos na vida, na obra e no estilo de Gullar, o que resultou, entre outros trabalhos, no livro “Gullar Gullar”, recentemente publicado.
            O livro é o que alguns teóricos chamam de obra-pastiche e não pode ser creditado apenas à admiração de um escritor por outro, mas sim como fruto de inúmeras horas de estudo e de dedicação. O livro de Quiroga é tecnicamente um pastiche, na melhor acepção da palavra, podendo ser colocado lado a lado com outras obras que também prestam homenagem estilística a grandes escritores das letras nacionais, como é o caso de “Em Liberdade”, de Silviano Santiago, que retoma o modo de escrever de Graciliano Ramos; e “Capitu: Memórias Póstumas”, de Domício Proença Filho, que faz uma imitação artístico-estilística da prosa de Machado de Assis.
            Pastichar não é uma tarefa fácil e não pode ser confundida com uma mera imitação do estilo de alguém. Trata-se de uma arte que exige extremo domínio técnico e teórico de um estudioso com relação à produção intelectual do autor que será homenageado. Marcus Vinícius Quiroga consegue em seu livro passar para o leitor o sabor e o prazer de ler Gullar com a certeza de que os versos não foram produzidos pelas mãos ou pela cabeça do escritor maranhense.
            Praticamente todos os ingredientes que tornam a poesia de Gullar única dentro do universo literário mundial são resgatados por Quiroga em seu minucioso trabalho. A ênfase na natureza morta, a fragmentação dos versos, as críticas sociais, as sinestesias e a dicção marcante do autor de Dentro da Noite Veloz encontram-se muito bem representadas no livro. Em alguns momentos, o leitor desavisado pode até pensar que está a ler um texto da lavra de Gullar, tal o grau de semelhança estilística e vocabular urdido pelo escritor carioca durante a confecção dos versos.
            Contudo o livro “Gullar Gullar” não pode ser lido apenas como um pastiche, pois há nele também vários momentos em que Quiroga deixa suas marcas de pesquisador da obra do poeta maranhense e faz enlaces com dados biográficos de Gullar, o que pode proporcionar ao leitor momentos bastante interessantes de cruzamento do que vem a ser texto gullariano relido por Marcus Quiroga e do que pode ser a marca quiroguiana dentro das estruturas poéticas de Gullar. Mas de qualquer maneira, o amante da boa poesia sairá satisfeito com o resultado final da tessitura poética engendrada pelo poeta-pesquisador.
            Gullar Gullar não é um livro feito apenas para quem admira o trabalho do grande poeta maranhense e deseja saber algo mais sobre sua produção, mas sim é um trabalho artisticamente bem construído e que pode tanto servir como leitura lúdica, para quem deseja apenas mergulhar nas águas nem sempre límpidas e cálidas da Poesia, podendo também dar bons frutos para quem resolva lançar um olhar pragmático sobre as páginas do livro, em busca de verdades que podem se esconder por trás de cada verso.

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